Descobrindo o Tarot

fevereiro 4, 2011

UPDATES DE SIGNIFICADO 10 – DANÇANDO COM O DOIS DE PENTÁCULOS

Antes de qualquer coisa, o cara tá dançando! É um malabarista. Foi durante uma conversa que eu percebi, pela primeira vez, esse aspecto tão primário da imagem do Dois de Pentáculos. Sim, um Tarot a cada dia, muitos tarot’s em um mesmo baralho.

Vamos começar pelo começo, mergulhando no universo de significados do Dois de Pentáculos através de seu gancho natural – sua imagem. A figura a que ela remete é bastante significativa – o artista mambembe, popular. Pamela Smith, a artista inglesa que compôs as imagens do baralho Rider-Waite-Smith em 1909, era bastante envolvida com o teatro, profissional e pessoalmente. Podemos ver traços desse seu envolvimento profundo ao longo de toda a coleção de imagens do RWS. O uso de referências teatrais era natural para Pamela – faz parte do seu “vernáculo pictórico”, digamos.

Como podemos ver, Pamela recorreu mais uma vez a esse seu vernáculo para dar forma e cor à ideia da mudança, conceito-raiz do Dois de Pentáculos. “Mudança” é uma palavra muito usada atualmente – tanto que seu significado ficou meio gasto, soa lugar-comum. No entanto, o Dois de Pentáculos não ilustra a mudança como uma simples alteração de um estado para o outro, mas, indo além dessa percepção rasa, retrata a mudança como estado fixo de constante alteração e impermanência, tipificado justamente pelo processo contínuo de fluxo e troca entre os estados. O lemniscata (a forma de 8, símbolo do infinito) unindo os dois discos à guisa de corda é um elemento simbólico importante da imagem do Dois de Pentáculos, que marca justamente essa ideia de eternidade. Sem começo nem fim, esse estado de mudança é simplesmente como as coisas são. A mensagem mais primária do Dois de Pentáculos é a de que a constante permutabilidade de estados é a condição ultérrima da realidade. O estado de total permanência na unicidade e ininterrupto gozo estático é típico do Plano das Causas. Aqui, no Plano dos Efeitos, reina a multiplicidade, e tudo muda constantemente.

A presença do lemniscata ressalta uma ideia importante a respeito da mudança, de que também trata diretamente o Dois de Pentáculos. Considerando que mudança define-se por alteração, e alteração calca-se em diferença, temos então que o eterno estado de mudança do universo baseia-se na constante permutação dos opostos. Essa ideia é bem expressa nos dois discos do “Dois de Moedas”, cara & e coroa – yin e yang. Com efeito, é assim que vemos retratado na versão do Crowley-Harris-Thoth para essa carta. Assim como a música consiste de permutações organizadas de silêncio e som, e a dança na troca constante entre movimento e estaticidade, o personagem do Dois de Pentáculos existe e é, simplesmente é.

É interessante notar como que, ao escolher um dançarino performático para retratar esse estado, Pamela cria um irresistível paralelo entre a figura do Dois de Pentáculos e as imagens orientais de Shiva Nataraja, o aspecto do deus hindu Shiva como o rei da dança, retrato do eterno movimento do cosmo. Conexões interessantíssimas começam a surgir quando notamos que o arcano 21, O Mundo, porta essa mesmas ideias em sua imagem – uma figura dançarina cercada por uma guirlanda, bastante similar a Nataraja. É mais interessante notar ainda que o deus Shiva, na trimurti (a trindade hindu) corresponde no esoterismo justamente ao Plano dos Efeitos, o seio da Manifestação – nossa realidade. E, para te deixar mais doido ainda, vale lembrar que, no sistema da Golden Dawn, o Dois de Pentáculos corresponde ao terceiro decanato de Capricórnio, regido por Júpiter – Júpiter em Capricórnio, portanto. Júpiter corresponde à Roda da Fortuna (mais uma vez, mudança constante), e Capricórnio (O Diabo) está naturalmente ligado ao Mundo, já que o arcano 21 corresponde a Saturno, planeta regente desse signo. Sua cabeça deve estar rodando; um círculo é traçado e se fecha – ou um lemniscata, talvez; é justamente essa a beleza do sistema GD.

Se, pictoricamente, a versão do RWS para o Dois de Pentáculos parece dar fiel continuidade à proposta de interpretação que atribui a essa carta o valor primordial da mudança, no que tange aos significados, Waite parece ter decidido permanecer um pouco menos profundo, digamos. Para os significados do Dois de Pentáculos, o autor recorre a um resumo das ideias que se voltam para o lado mais adivinhatório das cartas. “(…) Felicidade, recreação (…) mensagens, agitação e complicações”, é o que ele diz no Pictorial Key. Os dois últimos significados claramente foram tirados de Etteilla, que atribui a essa carta toda a sorte de coisas relacionadas a problemas, inquietações e obstáculos. Interessantemente, a imagem comporta essas três nuances de significado (a. alegria e divertimento; b. mensagens e notícias; c. complicações e agitação) com suficiente flexibilidade. As embarcações, ao fundo, enfrentando um mar nada pacífico e, aparentemente, seguindo bem o fluxo, podem ser lidas tanto como versatilidade ante os altos e baixos da vida, quanto como um indicativo mais literal de notícias, viajens, mobilidade e mesmo comércio, permutas.

Pertencendo a um naipe relacionado principalmente a questões materiais e de ordem cotidiana, o Dois de Pentáculos tem toda a sua força ágil e móvel aplicada principalmente nessa área. É uma carta que fala bastante sobre trocas, movimentações de qualquer espécie, viagens, mudanças. O Dois de Pentáculos fala da constante alteração do valor, e de como tudo depende de tudo.

Em leituras, eu costumo ver o Dois de Pentáculos mais nas seguintes linhas –

  • Mudanças – mobilidade, outros lugares, viagens, deslocamentos;

  • Comércio – troca, vendas, transações;

  • Interação – relações de troca, contatos, conhecer pessoas;

  • Flexibilidade – lidar com as coisas com leveza, versatilidade, saber contornar os problemas, ser rápido no gatilho e ter jogo de cintura, ter traquejo;

  • Agilidade – rapidez, graça, mobilidade, esperteza;

  • Multitasking – as pequenas tarefas do dia-a-dia.

Compare a imagem do Dois de Pentáculos com a imagem de outro Dois, o de Espadas. Duas formas de se lidar com os opostos – a total mobilidade dos Pentáculos versus a estrita imobilidade equilibradora das Espadas. É legal salientar a recorrente similaridade de teor entre cartas de mesmo número dos naipes de Bastões e Espadas, e dos naipes de Copas e Pentáculos. Os Dois são um bom exemplo: temos interação e movimento nos Dois de Copas e Pentáculos, e estaticidade e controle (interno, no caso das Espadas, externo, nos Bastões) nos outros dois naipes.

Compare o Dois de Pentáculos também à Temperança. E, de certa forma, também ao arcano 0, O Louco.

dezembro 25, 2010

UPDATES DE SIGNIFICADO 9 – Cinco de Copas + ‘Bridge Over Troubled Water’

Novas visões sobre uma carta em particular podem vir de qualquer direção. As que aparecem espontaneamente costumam ser as melhores.

Durante umas boas horas antes de começar a escrever esse texto, fiquei com uma música na cabeça, tocando sem parar. Eu estava fora de casa, e assim que cheguei, logo baixei a tal música. Ao ler as letras, a identificação foi imediata – bam!, Cinco de Copas.

Na primeira vez que eu decidi analisar um pouco mais a fundo o Cinco de Copas, nunca imaginei que seria uma canção que me elucidaria de forma tão especial o que essa carta representa.

Todo mundo conhece Bridge Over Troubled Water, de Paul Simon & Art Garfunkel; bem, ao menos todo mundo dos vinte e muitos pra cima. Single epônimo do album que acabou sendo o último da carreira dos dois cantores como dupla, Bridge Over Troubled Water permaneceu por nada menos que seis semanas no primeiro lugar das top cem da Billboard, assim que o album em questão foi lançado, nos primeiros meses de 1970. A canção fala sobre amor e companheirismo em momentos difíceis e tem a típica sonoridade melosa dos anos setenta, com boas doses de eco, solos de piano e final grandioso orquestrado sugerindo sentimentos transcendentes.

A imagem central da canção é o que me remete ao Cinco de Copas. No refrão, Garfunkel, com sua voz de falsete, canta –

I’ll take your part
When darkness comes
And pain is all around
Like a bridge over troubled water
I will lay me down
Like a bridge over troubled water
I will lay me down

Eu ficarei ao seu lado
Quando a escuridão vier
E a dor estiver em todo lugar
Como uma ponte sobre águas agitadas
Eu me dedicarei a você
Como uma ponte sobre águas agitadas
Eu me dedicarei a você

Com a figura da ponte, Simon cria uma bonita imagem de cumplicidade e solidariedade, suporte emocional. Nas águas agitadas das emoções de seu interlocutor, Simon oferece-se como a ponte, pela qual ele poderá passar incólume, sem ser levado pelas águas.

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Ao fundo da cena do Cinco de Copas, há uma ponte.

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

(‘…uma ponte está ao fundo, levando a uma pequena fortaleza ou propriedade.’)

Arthur E. Waite, The Pictorial Key to the Tarot.

O papel da ponte no background do Cinco de Copas é difícil de precisar com certeza. Seja qual for, certamente não é eventual, visto que Waite faz questão de mencioná-la em sua curta descrição para essa carta.

Capa do album "Bridge Over Troubled Waters", de Simon and Garfunkel, 1970

A recorrência desse motivo da ponte, me ocorre, poderia explicar sua presença condensada em imagem no Cinco de Copas – não obstante o gap temporal entre a carta e as duas canções. Talvez essa figura de linguagem seja comum à língua inglesa, talvez seja algum tipo de expressão.

Na carta, temos às margens do primeiro plano o retrato de um estado emocional pesado, de desamparo e solidão; às margens do fundo, uma construção. No universo pictórico do RWS, construções e casas têm sugerida essa implicação de segurança, paz e proteção. Ligando os dois estados, a ponte.

Estaria tal ponte, portanto, destinada a transportar o personagem para um lugar mais seguro? Outra carta que carrega essa conotação de transporte para uma margem mais tranquila é o Seis de Espadas. No entanto, nesse Seis, a mudança (e não o estado ruim, como no Cinco) recebe o foco, e resume-se em ação. No Cinco, o foco está no estado,
enquanto a mudança, representada pela ponte ao fundo, recebe um papel secundário, e parece representar mais uma possibilidade de transição que uma transição de fato. A ponte está ali, porém cabe ao personagem triste decidir cruzá-la. Então, como a ponte de Bridge Over Troubled Waters, ele poderá passar por esse momento difícil sem ser carregado por ele.

Na próxima vez que você vir o Cinco de Copas, não entre na noia do personagem central, mas procure a mensagem das entrelinhas. Não veja somente tristeza – veja também possibilidade de recuperação e transição. Está na carta.

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Som. . . Prá quem quiser escutar a música na íntegra, só clicar aqui. Para baixar o arquivo a partir desse link, clique com o botão direito e escolha a opção ‘salvar link como’.

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Biblio. . . info sobre a música foi tirada da Wikipedia.

dezembro 15, 2010

UPDATES DE SIGNIFICADOS 8 – Dez de Bastões e o perdão

Opressão. Sobrecarga. Peso insustentável.

Essas são as palavras que geralmente nos vêm à mente tanto quando lemos sobre, quanto quando simplesmente olhamos para essa imagem. De fato, está na carta – o sujeito realmente carrega um peso que aparenta aproximar-se dos limites de sua força. Nas palavras do próprio Waite, “The chief meaning is oppression simply.” (‘O principal significado é simplesmente opressão’).

Em consequência dessa noção fixada, foi desconcertante quando, ao lançar ao Tarot a questão “o que é perdão?”, obtive como resposta o Dez de Bastões. Minha primeira ideia foi que o baralho estava me dizendo que perdoar era tirar um enorme peso das costas. Entretanto, isso não me pareceu soar bem – além de extremamente lugar-comum, tal interpretação não estava coerente com a imagem da carta, essa longe de mostrar alguém tirando qualquer esforço de cima de si. Tirei alguns segundos para mergulhar mais fundo no Dez de Bastões – olhar a imagem de verdade.

“Perdoar é um tremendo esforço, que te leva aos seus limites, demanda capacidade de sustentação e foco, confiança e força de vontade. E, sim te deixa desorientado, e te faz perder de vista aonde quer chegar.” O Tarot é simples – óbvio até. Pena que a gente goste tanto de complicar. Naquele momento, nos curtos segundos em que eu fiz o exercício de mergulhar um pouco além da superfície do Dez de Bastões, obtive um poderoso insight que ficou na minha cabeça pelo dia inteiro. Não que perdoar signifique sempre isso – claro. É só que, naquele momento, e no contexto da minha situação, perdoar traduziu-se pelas combinações de sabores e aromas semânticos que o Dez de Bastões compreende.

Acho inclusive que isso foi um bom exemplo da coisa toda de trazer a carta ao contexto da situação, e indo além, tirar um substrato proveitoso de sua atividade. Ler cartas abrange mais saber contextualizar e combinar ideias que decorar significados e lançá-los na leitura.

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Voltando ao Dez de Bastões, o que vemos? Os diversos elementos próprios do campo conferem a essa cena um ar rural. Ao fundo, campos arados, e uma construção que lembra uma casa grande de fazenda. Os campos parecem ser os mesmos do Pajem e do Cavaleiro de Ouros; a casa parece ser a mesma vista de dentro no Quatro de Bastões. No primeiro plano, um homem forte, com roupas semelhantes às de um camponês medieval, carrega um conjunto de varas, como se fossem um fardo. Em vez de carregá-las nas costas, ele as carrega de uma maneira incomum – todas à frente de seu rosto, obstruindo sua visão. Ainda assim, sua postura é curvada, como a de alguém que carrega algo muito pesado sobre as costas.

A cena da última carta do naipe de Bastões parece ser o resultado natural do desejo de êxito ilustrado ao longo de todo esse naipe – o impulso de conquista do Três, a aclamação do Seis, a extrema força e resistência do Nove, etc. É interessante notar que na primeira carta da saga de Bastões, o Dois, o sujeito já é dono de uma vasta propriedade. Os campos arados, tanto no Dois quanto no Dez, sugerem mesmo poder agrícola, que envolve propriedade, produção de bens de consumo e comércio. As terras do homem do Dois de Bastões desembocam num grande corpo de água, possivelmente o mar, o que me faz pensar mais uma vez em poderio comercial. O mar, agora com navios similares aos de Colombo, se repete na carta seguinte, o Três. O que motivou as explorações do século 15/16 se não o desejo de comércio e expansão de território? O dono de terras agora quer estender seus domínios, e aumentar sua riqueza – ele quer mais. Levando isso em consideração, temos a tênue sugestão de que ambição e ganância são duas palavras que, embora não mencionadas, estão na raiz dessa carta.

Waite não se limita a definir o Dez de Bastões como opressão – –

(…) O principal significado é simplesmente opressão, mas é também ventura, ganho, qualquer espécie de sucesso, e então é a opressão dessas coisas. É também uma carta de falsa aparência, disfarce, perfídia. O lugar de que a figura está se aproximando pode sofrer com os bordões que ela carrega (…)”

A parte da perfídia Waite tirou claramente de Etteilla, que oferece para essa carta uma lista de palavras tais como “traição, subterfúgio, deslealdade e dissimulação”. Interessantemente, a lista de significados de Etteilla para o Dez de Bastões quando invertido aproxima-se muito dos significados que Waite posteriormente lhe atribui – –

Obstáculo, atenciosidade, barreira, impedimento, fustigação, dificuldades, dor, arduidade, inconveniência, miséria, ninharia, queixume, pedra no caminho, defesa, fortificação, refúgio.

A ideia central de Etteilla gira em torno de obstáculos e barreiras (como a que se forma com as varas entravando a visão do homem) e dificuldades e arduidade (sua postura pesada, o doloroso esforço que ele faz para carregar sua carga). Por outro lado, Etteilla também fala de refúgio, o que me faz pensar no casarão ao fundo.

Na avaliação final da carta, eu não levo tanto em consideração os significados do Dez de Bastões relativos à constelação da perfídia, e nem tanto aos de refúgio, e essa escolha não é arbitrária. No meu estudo, meu lastro na avaliação da força de cada carta é a sua imagem no RWS. Minha regra pessoa dita que quanto mais algo é explicitado na imagem, mais fortemente ele representa seu caráter. No entanto, a verificação dessas nuances de significado é importante a fim de que entendamos melhor os elementos componentes da imagem – muitas vezes, um elemento aparentemente dispensável (como a casa, na carta em questão) passa a fazer sentido quando vemos o que os autores possivelmente tinham na cabeça ao criarem a carta.

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Viajando. . . . . .Juntando à cena o que Waite diz a respeito da carta, podemos imaginar uma estorinha em que a fazenda pertence ao homem, assim como o casarão do fundo. Ele conseguiu tudo isso com muito trabalho e, agora, luta para manter tudo o que alcançou. No maior estilo ‘mordendo mais do que se é capaz de mastigar’, ele arca com as consequências de sua própria ganância.

Alternativamente, se pensarmos na sequência do naipe de Bastões de trás para frente – como ela é exposta no livro de Waite para o baralho – o homem do Dez de Bastões é um trabalhador que se esforça aos seus limites para conseguir domínio e poder. Na então última carta da sequência, o Dois de Bastões, ele é retratado como alcançando tudo isso.

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Examinando um pouco, percebemos portanto que a receita original do Dez de Bastões envolve generosas quantidades de muito esforço, peso e sofrimento, como também pitadas apimentadas de ambição e ganância, o que confere à mistura um aroma geral do peso do sucesso. A força causal dessa carta é simplesmente o peso enorme oprimindo o consulente, então ela pode surgir em leituras para sinalizar o trabalho mega cansativo de sustentar tal peso. A maior mensagem que o Dez de Bastões me sugere agora (especialmente com a ideia do perdão em mente) é a de que grandes ambições demandam grande esforço. Como carta final, o Dez de Bastões quer dizer sim sucesso, porém um sucesso que traz mais adversidade que gozo. Você consegue, mas para manter o que conseguiu, terá de lutar tanto quanto o que lutou para conseguir. Ou mais.

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Vivência simples do Dez de Bastões na vida cotidiana. . . . . Imagine-se voltando para casa do supermercado ou do shopping a pé, carregando em cada mão dez sacolas pesadas, cheias do monte de coisas que você comprou. Quem conseguir imaginar, ou mesmo já tiver passado por isso, terá apreendido boa parte da mistura que essa carta abrange.

dezembro 6, 2010

UPDATES DE SIGNIFICADOS – O Enforcado/Pendurado. A Temperança

Filed under: Arcanos Maiores, Updates de Significados — Tags:, — Leanora Dias @ 4:19 AM

O Enforcado

está pendurado, e não enforcado, porque ele não trata de morte, mas de suspensão.

Alguns tipos de meditação, determinadas práticas ritualísticas e certas drogas alucinógenas, como o LSD, provocam um estado de consciência conhecido como “morte do ego”, ou ego death, que se caracteriza por uma temporária suspensão do próprio conceito de eu na nossa consciência. Você experimenta a realidade, mas não como você.

Prá mim, o Enforcado do Tarot parece retratar um estado semelhante de suspensão do ego. Claro a carta não está histórica/iconograficamente relacionada a isso diretamente. Mas (talvez depois de tudo o que aconteceu com ela durante todos esses séculos), ela certamente tem esse feeling.

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A Temperança, ela pode estar misturando ali o Quente e o Frio, pra justamente temperar. Essa coisa de quente x frio me faz pensar na ideia de temperar mesmo – equilibrar a temperatura – bem como na noção aristotélica de Quente e Frio como duas das quatro qualidades da matéria (as duas outras sento Seco e Úmido). O Quente é a qualidade dominante do elemento Fogo, e o Frio é a qualidade dominante do elemento Água (ao contrário do que se poderia pensar, o Úmido domina o Ar). Fogo e Água são os dois elementos primordiais, então, de certa forma, ela cria, ou melhor, ela recria, recompõe a criação. Ela reorganiza os elementos da matéria, de modo a criar algo novo. O anjo da temperança manipula a matéria num nível mais profundo que o Mago, pois este manipula os efeitos, enquanto a Temperança trabalha a matéria em suas origens, em seu nível mais profundo. A Temperança manipula algo que é, em si, imaterial, ainda que constituinte da matéria – essencial. E essa palavra “essência” tem muito a ver com a Temperança, porque ela mexe com o éter, com o élan.

novembro 25, 2010

Desdobramentos de significados para o Pajem de Espadas + impopularidade do Crowley-Harris-Thoth

Recentemente, Henrique levantou duas questões que eu achei interessante postar aqui pro público, por serem dois assuntos que dão um pano pra manga legal. Sem mais enrolação por hoje, vamos direto ao ponto. Primeiro, os assuntos mais simples.

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Crowley-Harris-Thoth……………………………………………Henrique já começa mexendo na polêmica e deixando a ideia no ar –

Porque existem tão poucas informações sobre o tarot de Thot? Existe muito preconceito sobre esse tarot, mas penso que a simbologia dele é bastante rica e que ele tem uma incrível força com relação a intuição do leitor. Mas algumas cartas parecem ser bem confusas, principalmente se comparadas aos outros sistemas. Uma dessas cartas que me intrigam é o 7 de Pentáculos entre outros que tem significação bem diversa. O que você tem a dizer sobre esse baralho e seus “mistérios”?

Eu já percebi que faltam mais divulgadores do CHT em português, e eu acho que isso se deve largamente à predileção da mentalidade brasileira pelas visões mais tradicionais do Tarot. Eu percebo que a mentalidade predominante do Tarot no Brasil valoriza mais o que é tido como clássico, e o CHT, com suas diversas modificações e inovações, meio que vai de encontro com todos esses valores. A personalidade de Crowley – ou, melhor dizendo, a imagem construída ao seu redor, e a caricatura daí decorrente – também parece contribuir para essa torceção de nariz. Pessoas não falam muito sobre o CHT, logo, pessoas não ouvem muito sobre ele – e então você tem uma reação em cadeia, e um processo que se retro-alimenta.

Eu não sei muito sobre o CHT, mas o que eu percebo é que ele é geralmente pouco compreendido – em parte por requerer do praticante que se propõe a esgotar suas possibilidades (ou, ao menos, usá-lo levando em consideração suas proposições originais) um conhecimento grande sobre outras áreas da doutrina esotérica. Quem não está afim de estudar já sai fora nesse primeiro item. Mas, de novo, nem todo mundo acredita que precisa saber disso para fazer uso do Thoth (ou de qualquer outro baralho), e eles não estão certos – nem errados, rs. Waite critica a cartomancia popular, mas deslavadamente a reproduz em seu trabalho; Crowley parece ter levado o Tarot completamente para o âmbito da Magia, do ocultismo, e de todas essas coisas pouco acessíveis, nem tanto por serem ocultas, mas muito por serem complexas, e exigirem bastante do aspirante a praticante.

A impressão que eu tenho do Thoth é que, com ele, o babado é sério. Crowley não estava de brincadeira ali. Nem ele, nem Lady Frieda Harris, que demorou cinco anos para finalizar o projeto, que incluiu, muitas vezes, diversas versões para uma mesma carta, até que se chegasse à mais próxima do ideal. Cinco anos, contra os nove meses em quem o Rider-Waite-Smith foi pintado (não que o RWS seja inferior, mas o trabalho foi maior no Thoth). Seu simbolismo é intrincado. Sua arte é elaborada. As propostas que lhe subjazem, arrojadas. A ideia por trás do Thoth é que ele não é só uma ferramenta de análise passiva da realidade, mas de influência ativa sobre a mesma. Crowley levou a sério a ideia de que as ‘cartas são alguéns’. Eu já disse isso aqui – no Thoth, Tarot e Alta Magia alcançam um patamar de união. Nesse sentido, eu acredito que o Thoth representa um novo salto no Tarot – um salto mais além. Waite tornou o Tarot acessível; Crowley consolidou sua relação com a Magia.

No entanto, mais uma vez, nada de julgamentos de valor. A coisa toda não é uma linha reta, e eu penso mesmo que essa mentalidade linear é prejudicial. Alexander Lepletier disse uma coisa em sua palestra da Mystic Fair que eu achei muito legal – tradições devem suprir as necessidades de seus praticantes.

Sobre os significados das cartas, oque eu sei é que Crowley levou bem a sério os preceitos da Golden Dawn sobre o Tarot, e o sistema que ela desenvolveu, fazendo mudancinhas aqui e ali no que ele julgava necessário. Os significados das cartas no CHT, bem mais que no RWS, baseiam-se bastante em Astrologia e Cabala, e nas correspondências desses sistemas com o Tarot, segundo a GD. Eu acredito que qualquer diferença pode ser verificada quando levamos esses fatores em consideração. Não é que suas cartas não fazem sentido, ou ‘estão erradas’ – é só que elas se distanciam dos outros sistemas em vários pontos.

Como eu disse, eu não sei muito sobre o CHT, meu foco é o RWS. Adash, do Pergaminho das Eras, é o especialista em Thoth que eu mais conheço. Se você lê em inglês, o Paul Hughes-Barlow do Supertarot.co.uk também é expert em Thoth.

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Deespadaempunho(s)………………….Em um post antigo sobre o Pajem de Espadas, Henrique levantou a seguinte questão –

Esta carta pode ser entendida também como pessoa de comportamento ansioso ou situação causadora de ansiedade? Falo isso porque penso nela desta forma em alguns jogos…………………………………………………..

“Ansiedade” é uma palavra muito usada hoje em dia. Geralmente, eu vejo pessoas usando essa palavra para identificarem uma situação ou um sentimento caracterizado por um forte desejo de que algo se realize – como quando você fica ansioso para que seu namorado chegue logo; ou para que venha logo o prato delicioso que você pediu no restaurante. Pelo que eu percebo, no discurso cotidiano, “ansiedade” identifica a aflição inquieta motivada por um desejo intenso por algo que ainda não se têm, mas sobre o qual há certa perspectiva de se ter em breve. Aquela sensação de eu-não-posso-mais-esperar, de quero-isso-muito-agora. Por outro lado, eu também vejo as pessoas usarem muito essa palavra como sinônimo de preocupação, aflição e sofrimento – “Calma, você tá muito ansiosa”.

A origem da palavra é anxius, adjetivo latino que quer dizer algo como “apreensivo, preocupado, atormentado”. Interessantemente, a origem do anxius latino é uma raiz que centraliza ideias de sufocamento, constrição e aperto. “Ansiedade” não se focaliza no desejo, e muito menos no objeto desejado, mas sim no desconforto que esse desejo não-satisfeito provoca. É essa entidade abstrata que ela parece pretender nomear.

Ainda assim, no dia-a-dia, “ansiedade” tem muito uma conotação de “desejo”, de “anseio“, desejo intenso e impaciente.

ansiedade

sf (lat anxietate) 1 Aflição, angústia, ânsia. (…) 3 Desejo ardente ou veemente. 4 Impaciência, insofrimento, sofreguidão.

Quando eu penso sobre “ansiedade”, me vem logo de cara outra palavrinha na cabeça – cupidez.


Sim, o nome do deus romano do amor, Cupido, está relacionado a essa palavra. Cupidu quer dizer “desejoso”. Desejo-insatisfação-sofrimento, essa é a constelação que eu proponho para “ansiedade”. Estaria o Pajem de Espadas, portanto, cúpido? Se sim, cúpido de que?

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Eu não costumo ver o Pajem de Espadas como nada disso.

Não diretamente, ao menos.

Entretanto, essa relação entre o Pajem de Espadas e o conceito da inquietação ou do desassossego não é nova, e parece ser popular, até. Muitas pessoas associam esse Pajem a inquietação, algumas mesmo levando essa noção de inquietação para caminhos mais pesados, transformando o Pajem de Espadas em um mensageiro de preocupações, insegurança, desconforto e problemas. É interessante notar essa evolução no processo de significação de uma carta. Uma perninha vai puxando a outra. Gera-se uma reação em cadeia de associações.

Essa visão mais pesada do Pajem de Espadas é curiosamente sugerida em seu retrato no Rider-Waite-Smith, sobre o qual Waite comenta:

“(…) Atravessa um terreno acidentado, e sobre o seu caminho as nuvens dispõem-se turbulentamente. Ele é alerta e ágil, olhando para todos os lados, como se um esperado inimigo pudesse surgir a qualquer momento.”

(‘(…) He is passing over rugged land, and about his way the clouds are collocated wildly. He is alert and lithe, looking this way and that, as if an expected enemy might appear at any moment.‘)

“Terreno acidentado”. “Nuvens dispostas desordenadamente”. Nem tem como negar. Confusão e problemas, sim. Já ouvi gente comentando que as nuvens ali sugerem confusão mental, pensamentos enuviados – ainda mais com uma boa porção das nuvens bem perto do rosto do personagem.

Mas, também, atenção – “(…) he is alert and lithe, looking this way and that, (…)”

Eu vejo o Pajem de Espadas mais como curiosidade, observação, descoberta, novas ideias, vivacidade, agilidade, flexibilidade, animação; e também como certa presunção, uma certa atitude de sabe-tudo, ou problemas de mal-entendido, dependendo das cartas ao redor. Eu gosto muito da descrição de Waite quando ele descreve esse pajem como “uma figura esbelta, viva, (…), caminhando com passos rápidos” (‘A lithe, active figure (…), in the act of swift walking‘). Silfídico (o que, convenhamos, é bem próprio de um personagem do elemento Ar). A descrição retrata um personagem todo atividade, meio inconstante, leve, fugidio e mutável – como as nuvens ao fundo, no céu, e o chão onde ele pisa. Outra coisa que me chama a atenção nesse pajem (e que já ouvi comentários antes) é a forma que ele segura a espada – com as duas mãos (detalhe que Waite também salienta quando diz ‘holds a sword upright in both hands’), como se não soubesse direito como portar uma espada. Ele é o único de sua corte a fazer isso.

Parece que, com o tempo, esse pajem parece ter incorporado bastante do aspecto mais conflituoso e problemático do naipe de Espadas. As pessoas parecem ter-lhe atribuído tal papel. No entanto, nem sempre foi assim. As primeiras tentativas de significar essa carta não foram tão contundentes com a coisa das intrigas, ou confusão. Etteilla não fala nada sobre isso. Em seu sistema, o Pajem de Espadas é muito relacionado a observação cuidadosa, espionagem e pesquisa – constelação de significado que Waite carregou à sua versão do Tarot, deixando-a parcialmente impressa na imagem de um jovem ativo sempre alerta, e com uma postura de desconfiança e certa tensão. De Mathers, Waite parece ter pegado os significados relativos a autoridade e poder. Indo por outra corrente, mais ligada à Cabala, a Golden Dawn caracteriza a sua Princesa de Espadas como graciosa, ágil, destra e meticulosa, e traça paralelos entre sua figura e as figuras de duas deusas romanas, quando diz que ‘(…) she is a mixture of Minerva and Diana – Minerva (a Athena grega) e Diana (Ártemis), justamente as duas deusas sempre virgens, alheias aos homens, imagens do feminino auto-suficiente, questionador do poderio masculino. Crowley endossa essa visão, e acrescenta que, quando mal-aspectada, sua inteligência e agilidade dispersam-se, tornam-se incoerentes, e criam um caráter baixo, voltado a fins vis.

O meu take sobre esse pajem é que ele representa as ideias em seu processo de formação, quando elas ainda estão pouco definidas, inconstantes e mutáveis. Sua imagem no RWS salienta seus aspectos de observação, atenção e agilidade – bem como, em certa medida, a rebeldia e irreverência mencionadas pela GD. O Pajem de Espadas pode tropeçar (claro, num chão desses…) – mas não perde o rebolado.

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Respondendo diretamente a sua pergunta, Henrique, eu não sei de onde exatamente você tirou de associar o Pajem de Espadas a ansiedade, mas nós dois pudemos ver que essa noção não é infundada. Existe sim uma visão desse pajem que o associa a complicações e problemas. Se você pratica com o RWS, é possível que você tenha sentido isso na imagem – os desenhos de Pamela são bastante eloquentes. Assim, se o que você procura é respaldo, não lhe falta.

Eu tenho percebido que esse desejo nosso (não sei se seu, mas muitas vezes meu, e eu admito sem vergonha) de confirmar significados tende a calcar-se em uma vontade de justificar, legitimar, normatizar uma intuição ou insight que temos a respeito dessa ou daquela carta. Eu também tenho percebido que isso pode estar relacionado à nossa própria insegurança, ao nosso medo de errar, dizer besteira, ser incoerente, etc. Sempre a pressão de acertar, de ser correto, de ser perfeito – os fantasmas velhos dos praticantes de Tarot. Sobre isso, só digo uma coisa – vamos começar a exercitar nossa libertação disso. Ao menos em parte.

Eu acho legal pesquisar os significados de vários autores – particularmente os que estabeleceram as bases da conceitualização do Tarot de hoje. Quase sempre nossas ideias revelam-se ecos – mais ou menos fiéis – de algum desses pensadores. Quase sempre, a gente acaba percebendo que nossas ideias não são novas, que já teve gente que trilhou nosso caminho (e foi além) e, pra mim, isso é o legal de estudar o trabalho desse povo.

Significados são coisas pessoais – especialmente os das cartas menores. Minha descrição aqui pode ter parecido confusa, porém minha intenção foi justamente ilustrar como existe mais de um sistema de atribuição de significado às cartas – e como que, num certo nível, tais significados dependem de cada leitor. Como eu sempre digo, não existe um cânone – o que existem são diversas vozes, diversos expoentes de uma mesma carta, e diversas formas de abordá-la. O legal de estudar essa diversidade é tanto o fato de nos possibilitar contato com uma profusão de significados diferentes, quanto a consciência de que, em matéria de Tarot, nada é tão determinado – e determinista – quanto a gente gostaria que fosse.

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É isso, Henrique. Obrigado por participar do blog, e eu espero ter respondido suficientemente bem às questões que você levantou. Eu sempre complico, mas pelo menos um pouquinho eu tenho que explicar, rs.

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REFS

Minha referência para o post de hoje foi principalmente o site do Paul Hughes-Barlow, Supertarot.co.uk, que conta com uma ótima seleção de significados para todas as cartas, por diversos autores. Também, o Book T, de Mcgregor Mathers. Principal documento sobre Tarot da Golden Dawn.

novembro 21, 2010

CINCO DE BASTÕES- imagem

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Brincadeira.

Diversão.

Ludismo representativo.

Atuação & atividade.

Competição simulada.

Lutinhas.

Agressividade lúdica.

novembro 13, 2010

UPDATES DE SIGNIFICADO 6 – IDEIAS RELÂMPAGO

Só pra não ir dormir em branco, algumas coisas que têm permanecido na minha cabeça – insights que tive nas últimas leituras que fiz.

Cavaleiros são heróis – ampliação de horizontes. O Cavaleiro como a figura que vai além das fronteiras de seu reino, aventura-se, amplia sua visão. Força conquistadora, impulso desbravador, predominância do instinto. Também, liberdade – essa é uma palavra bem Cavaleiros que eu nunca levo em consideração. A figura do Cavaleiro também é a figura do herói, aquele que se aventura por terrenos desconhecidos – um desbravador. Os terrenos desconhecidos podem ser dentro de si mesmo – enfrentar medos, dominar impulsos. A gente vive nossas vidas num eterno processo composto de inúmeras repetições de padrão, e nos tornamos reféns disso – A Roda da Fortuna. O Cavaleiro vem justamente pra quebrar esse paradigma e trazer o novo – a novidade, a notícia, o pedaço de informação que vai criar novos paradigmas.

Quando lhe cair um cavaleiro, tenha coragem. Enfrente o dragão. Coloque-se em risco, arrisque tudo, ande na corda bamba, exponha-se, siga seu coração. Numa palavra só – viva, de verdade.

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Essa coisa de cavaleiros e terrenos desconhecidos me fez lembrar daquela faixa batidésima da Alanis Morissette, Uninvited, onde, num trecho da letra, ela diz, “Like any uncharted territory I must seem greatly intriguing” (‘como qualquer território não mapeado, eu devo parecer muito intrigante’). O cavaleiro corre atrás desse mistério, desse tesão.

O Cavaleiro de Bastões busca sua liberdade e corre atrás do novo, do estrangeiro, ele é responsável pela inovação;

O Cavaleiro de Copas vai em busca dos seus sonhos, da sua imaginação, ele mergulha fundo dentro de si mesmo, intensamente;

O Cavaleiro de Espadas luta pelos seus ideais, pelas suas verdades, inflama-se pelo que acredita;

O Cavaleiro de Pentáculos vai em busca da realização, ele trabalha para trazer ao mundo algo que ainda não existe – mas que vai existir com o seu fazer.

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Como Yod, os Cavaleiros são a força da Vida, o impulso que puxa os seus naipes como Áries encabeça e puxa o Zodíaco todo. Eles estão relacionados diretamente aos Dois, porque ambos relacionam-se a Chokmah na Árvore da Vida – –

Cavaleiro de Bastões + Dois de Bastões – Domínio, auto-afirmação, poder, ousadia, autoridade.

Cavaleiro de Copas + Dois de Copas – amor, união, harmonia, transpessoalidade, romance.

Cavaleiro de Espadas + Dois de Espadas – equilíbrio, justiça, frieza, trégua, diplomacia.

Cavaleiro de Pentáculos + Dois de Pentáculos – fluência, alternância, dinamismo, versatilidade, sensibilidade. O Dois de Pentáculos é o malabarista, aquele que eleva o sentido do tato, do físico, à sua mais alta potência – é preciso grande habilidade para fazer o malabarismo. É o contato com a matéria em sua forma mais sofisticada.

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RODA DA FORTUNA – recentemente, alguns dias após eu ter publicado meu post com a Lista Negra, a Roda da Fortuna me caiu encabeçando uma consulta, na carta que eu tiro para inaugurar a consulta inteira. Isso me obrigou a olhar para essa carta, como também meu deu a oportunidade de mergulhar dentro dela. E, lá no fundo, o que eu encontrei foi eterno movimento. O movimento da Roda da Fortuna é rápido o suficiente para te manter preso a ele, na força centrífuga que ele gera.

A Roda da Fortuna é velocidade, é constante movimentação, e intensa força. Ela é a força da vida que gira e se move constantemente, flui.

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O EREMITA – Outra carta que me apareceu recentemente em leituras. O Eremita não passa por privações porque ele não tem condições, mas porque ele quer. Então, seu estado não é de sofrimento, mas de contentamento. Um contentamento que advém justamente da ausência, da falta. É como se, na ausência, ele encontrasse a verdadeira presença; no nada, é como se ele encontrasse o tudo escondido, finalmente, onde ninguém jamais suspeitaria que ele estava.

O Eremita me faz pensar nos padres e freis antigos que faziam voto de pobreza. É privação em nome de uma causa, por um motivo específico, por uma crença. Que nem quando você deixa de comprar mais uma calça pra poder pagar um curso que você quer fazer.

O Eremita também me faz pensar em solidão voluntária – o que passa a ser solitude. Solitude é legal – você encontra uma liberdade que tem a ver com a ausência de cobranças, você passa a ser seu único chefe, e dessa liberdade vêm a responsabilidade. Ficar sozinho te faz conhecer-se melhor, muito melhor, porque seu foco externo murcha, e você tem a oportunidade de conscientemente olhar mais para si mesmo, sem pedras na mão.

Acho que o Eremita fala dessa descoberta de uma segunda instância do si, do eu. Daí a luz na mão dele. A relação do Eremita com o signo de Virgem é papo pra pesquisa e outro post.

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Hypnos e Morpheu pra mim agora J


novembro 11, 2010

UPDATES DE SIGNIFICADOS 5 – O Mundo + Seis de Copas

Hey hey!

Os dois updates de significados de hoje são fruto de – vejam só – comentários de leitores! Abaixo, os dois pequenos insights que eu tive a respeito de duas cartas mencionadas em comentários que recebi ontem (sendo que uma delas figura na lista negra) – O Mundo e o Seis de Copas.

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TUDO (e mais um pouco) “O Mundo”… Alguém já parou pra pensar em o que significa esse nome? Tipo, no significado profundo desse ato de intitular uma carta de O Mundo? (tudo nessa vida, nesse mundo, tem sempre um significado mais profundo que a nossa mente cotidiana gosta de perceber). O Mundo é tudo. O que pede agora uma resposta é justamente o que é tudo?

Eu posso imaginar na mentalidade renascentista (de onde o Tarot suposta/provavelmente veio) o que isso deveria significar. Assim, sem pesquisar muito, eu tenho a ideia de que a ideia de mundo era a ideia de totalidade, do planeta, de tudo mesmo. Nessa mentalidade, a ideia de mundo está diretamente relacionada à ideia de tudo.
As pessoas daquela época não deviam ter a noção de todo que a gente tem hoje. Acho que, pra eles, o todo era o mundo, com suas terras, seus mares, o céu, as estrelas lá encima, etc. Hoje, seiscentos anos depois, nossa consciência de todo se expandiu para incluir o universo infinito. Nossas fronteiras se ampliaram. Não é de se espantar, portanto, que muitos baralhos mais modernos tenham substituído o nome do último arcano maior por O Universo.

O Mundo é a Criação. Você já deve ter ouvido pessoas se referindo ao universo ou à totalidade das coisas como a Criação. A ideia por trás disso é deixar subentendido que todas as coisas que existem foram geradas por um Criador (se é uma criação, deve haver um Criador, certo?). É legal pensar um pouco nisso. O ato de criar se resume a trazer algo ao mundo, fazer algo real, tangível. É o que todos os deuses primordiais de todos os mitos fazem – eles dão existência ao mundo – do Nada eles fazem o Tudo.

criar
cri.ar
(lat creare) vtd 1 Dar existência a, tirar do nada: “No princípio criou Deus o céu e a terra” (Bíblia, tradução do Padre Figueiredo). vtd 2 Dar origem a; formar, gerar: O medo cria fantasmas. vtd 3 Imaginar, inventar, produzir, suscitar: Criar uma religião. “Deus criou as boas coisas só para os parvos?” (Camilo Castelo Branco). (…)

Dicionário Michaelis

A carta d’O Mundo do Tarot é justamente isso – a Criação, a totalidade das coisas. Em outras palavras (talvez pra colocar as coisas num jargão mais esotérico) o Mundo é a Manifestação. É o resultado final do processo de criação. É nesse sentido que ela é a compleição, a realização – a compleição da obra, a realização do trabalho. Como se a obra de Deus fosse gerar o plano material, e a carta d’O Mundo representasse justamente o resultado final dessa tarefa. A coroa de louros é um famoso símbolo de vitória. Talvez a gente possa ver a guirlanda de louros que frequentemente aparece nessa carta como um sinal de dever cumprido, de trabalho completo, arrematado, ‘concluído com louvor’. Perfeição.

perfect (adj.)

Early 13c., from Old French parfit (11c.), from Latin perfectuscompleted,” past participle of perficere “accomplish, finish, complete,” from per- “completely” + facere “to perform”.

Online Etymology Dictionary [bold meu]

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‘Perfeição’ significa ‘compleição’.

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¹ Assim foi concluída a criação do céu, e da terra, e de tudo o que há neles.

² No sétimo dia Deus acabou de fazer todas as coisas e descansou de todo o trabalho que havia feito.

³ Então abençoou o sétimo dia e o separou como um dia sagrado, pois nesse dia ele acabou de fazer todas as coisas e descansou.

Bíblia, Genesis, cap. 2, 1-3

No sétimo dia Deus acabou de fazer todas as coisas e descansou de todo o trabalho que havia feito.”
Esotericamente, essa afirmação tem um significado todo especial, que tem a ver com o processo de Manifestação em si. No sétimo dia, Deus descansou, repousou (no âmago da matéria?), pois o mundo estava feito – completo, per-feito. Disso a gente tira que a Manifestação, o processo de criação que origina o Tudo, se deu em sete estágios.

A carta O Mundo corresponde a Saturno. Saturno é justamente o sétimo planeta – sétimo e último estágio. Uma vez, um amigo salientou um ponto importante a respeito dessa correspondência – Saturno foi, por muito tempo, considerado o último planeta, guardião portanto dos limites, das fronteiras do universo. Aquele que abarca tudo, dono da totalidade, senhor do próprio tempo. Nesse sentido, existe uma interessante semelhança entre essa relação da carta do Mundo com Saturno e a ideia da carta do Mundo como retratando a Eternidade posterior ao Dia do Juízo Final (nada mais lógico, considerando que o Julgamento, ou Juízo, é a carta que antecede o Mundo). Ainda, se o Mundo é a totalidade da Criação, isso envolve não somente todos os lugares, mas também todos os momentos – em uma palavra, a totalidade do espaço-tempo, ou seja, a eternidade.

É por isso que eu não gosto de arcanos maiores – eles são muito GRANDES, eles são esmagadores, pesados, não podem ser totalmente percebidos numa só olhada. Arcanos maiores não têm só três dimensões, mas quatro, rs.

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Pois bem, e o que todo esse blá-blá-blá filosófico quer dizer? O Mundo é uma carta material, não se enganem. Super material, tangível, físico. Ele é a própria existência em si, a Realidade enquanto o que é percebido, sentido. Ele é, sim, o final, a direção de todos os sentidos.

O Mundo é/está pronto. Prontinho. É a fruta madura no galho da árvore, o trabalho completo e perfeito. Maturidade, essa é uma palavra legal para essa carta.

Em leituras, o Mundo pode sair para indicar justamente essa compleição, essa realização, no sentido de trazer algo dos planos mais sutis para o plano tangível. O livro pronto nas prateleiras, em relação à ideia de fazê-lo e o processo de execução; a cerimônia de casamento, em relação ao amor que a motivou e os planejamentos para sua realização. Nesse sentido, essa carta completa e complementa o sentido do Ás de Pentáculos enquanto a matéria-prima para a compleição da Obra; o Ás de Pentáculos é a matéria-prima, o Mundo é a obra completa.

E,sim,praDeus,oNadaématéria-primasuficienteparasefazerumTudo.

O Mundo pode ser comparado, em diversos aspectos, ao Dez de Pentáculos, Malkuth de Assiah, a sephirah mais densa do mundo mais denso, o resultado final. A compleição da Obra. A diferença, acredito, é que o Dez de Pentáculos se refere mais especificamente às coisas materiais, ou especificamente ao aspecto corpóreo, material da realidade, enquanto que O Mundo é isso e mais todo o resto, rs.

No Mundo, os objetivos são alcançados, e as coisas se tornam reais – elas agora existem de verdade. Eu não vejo essa carta como potencial de realização – eu a vejo como Realização em si. É por isso que O Mundo é visto popularmente como a carta da Vitória. Nesse sentido, ela se aproxima do Seis de Bastões, mas mais uma vez seu sentido abarca uma temática mais ampla, enquanto o Seis se relaciona mais a auto-asserção, e coisas do tipo.

O Mundo é uma carta grandiosa, talvez a maior do baralho todo, justamente porque ele fala de Tudo. O Mundo coloca o Tudo em um só ponto, ele pontua a totalidade, transformando-a propriamente em uma única dimensão em si mesma. Ele é tudo. Ponto.

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E, pra quem se interessar, as etimologias da palavra “Mundo”, conforme o Online Etymology Dictionary


mundane
late 15c., from M.Fr. mondain (12c.), from L. mundanus “belonging to the world” (as distinct from the Church), from mundus “universe, world,” lit. “clean, elegant”; used as a transl. of Gk. khosmos (see cosmos) in its Pythagorean sense of “the physical universe” (the original sense of the Gk. word was “orderly arrangement”). L. mundusalso was used of a woman’s “ornaments, dress,” and is related to the adj. mundus “clean, elegant” (used of women’s dress, etc.)


cosmos
c.1200 (but not popular until 1848, as a translation of Humboldt’s Kosmos), from Gk. kosmos “order, good order, orderly arrangement,” a word with several main senses rooted in those notions: The verb kosmein meant generally “to dispose, prepare,” but especially “to order and arrange (troops for battle), to set (an army) in array;” also “to establish (a government or regime);” “to deck, adorn, equip, dress” (especially of women). Thus kosmos had an important secondary sense of “ornaments of a woman’s dress, decoration” (cf. kosmokomes “dressing the hair”) as well as “the universe, the world.” Pythagoras is said to have been the first to apply this word to “the universe,” perhaps originally meaning “the starry firmament,” but later it was extended to the whole physical world, including the earth. For specific reference to “the world of people,” the classical phrase was he oikoumene (ge) “the inhabited (earth).” Septuagint uses both kosmos and oikoumeneKosmos also was used in Christian religious writing with a sense of “worldly life, this world (as opposed to the afterlife),” but the more frequent word for this was aion, lit. “lifetime, age.”
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As decorrentes elocubrações eu deixo pra cada um que leu, rs.
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PrazerPassadoNostalgiaSaudades

InfânciaInocênciaNovidadesLiberdade

CarefreePartilhar sentimentos ————————————— Seis de Copas

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O Seis de Copas é uma boa evidência de como se deu o processo de criação dos desenhos de cada carta menor do Rider-Waite-Smith, e de como tais desenhos relacionam-se com os significados atribuídos para tais cartas. É evidente que Waite buscou inspiração para seus arcanos menores na literatura de que dispunha na época, e que incluía, além da doutrina da Golden Dawn, o trabalho de Éliphas Levi e Etteilla (se você não sabe quem são esses dois, pesquise – qualquer pessoa que estuda Tarot deve ao menos ter uma vaga ideia de quem foram essas duas figuras, e de seu trabalho no Tarot).

Crianças em um velho jardim, suas taças cheias de flores.

Significações divinatórias – Uma carta do passado e de lembranças, olhando para trás, como – por exemplo – para a infância; felicidade, prazer, porém mais vindo do passado; coisas que desapareceram. Outra leitura inverte isso, apresentando novas relações, novos conhecimentos, novos ambientes, e nesse caso as crianças estão brincando em um recinto que não lhes é familiar.

Essa é a descrição de Waite para o Seis de Copas. Compare com a descrição de Eteilla para a mesma carta –

O Passado, Tempos passados, Apagados, Anteriores, Previamente, Há muito tempo atrás, Nos velhos dias. Velhice, Decrepitude, Antiguidade.

Tradução minha da transcrição de Etteilla do SuperTarot.co.uk

O texto de Etteilla é do final do século 18; o de Waite é do começo do século 20. A influência é clara. Waite cita outra fonte que registra uma atribuição de significados para essa carta que vai na direção completamente oposta à proposta por Etteilla, relacionando o Seis de Copas a novidades. Finalmente, temos a interpretação da Golden Dawn que, baseando-se nas correspondências cabalísticas dessa carta (Tiphareth de Briah), intitulou-a “Senhor do Prazer” (‘The Lord of Pleasure’), descrevendo-a como “o início de um estável crescimento, ganho e prazer”.

É interessante notar como todos esses significados, ainda que muitas vezes díspares, estão sumarizados na imagem, que ao mesmo tempo evoca todo um ar nostálgico de infância, lazer e relaxamento, e mesmo a novidade, que pode ser vista incorporada na imagem das tenras crianças. O próprio Waite parece nos chamar a atenção para essa ambivalência na imagem, ao dizer que, no caso da carta ser lida como ‘novidades’, “as crianças estão brincando em um recinto que não lhes é familiar’. Waite ainda parece tentar conciliar o significado de ‘prazer’ dado pela GD com as ideias gerais de ‘passado’ atribuídas ao Seis de Copas, dizendo “felicidade, prazer, porém mais vindo do passado“.

Podemos então identificar três conceitos-base para a imagem do Seis de Copas do RWS – Passado, Novidades e Prazer. Combinando livremente essas três ideias, temos coisas como – nostalgia, boas memórias, inocência, começos… Existe também essa ideia de começo no Seis de Copas. Robert Wang diz que a ideia de começo de prazer dada pela GD ao Seis de Copas está relacionada à sua ligação com o segundo decanato de Escorpião, regido pelo Sol (Sol em Escorpião, portanto): “O Escorpião pode ferroar onde a Vontade determine. Assim, quando o Sol ativa as energias de Escorpião, a melhoria ou prazer tem início”.

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Em minhas próprias leituras, eu dificilmente vejo o Seis de Copas como ‘passado’, ou ‘memórias’. Não sei bem por que, mas esse significado nunca me pareceu muito praticável. ‘Nostalgia’, talvez, às vezes. O Seis de Copas é um dos casos em que eu estabeleço um contato mais com a imagem que com as ideias. A cena me fala de prazer, relaxamento, diversão descompromissada, brincadeira. Também as flores brancas e as crianças me fazem pensar em pureza de sentimentos e inocência. O ato de dar destacado nessa carta me chama particularmente a atenção, e na minha cabeça acende a luzinha – compartilhar emoções. Também, por ser um seis, eu logo penso nos Enamorados.

Pra quem à essa altura já está se perguntando como conciliar esse monte de significados diferentes, uma dica – Pamela já nos poupou desse trabalho, imprimindo na imagem elementos e ideias que nos evocam justamente todos esses significados ao mesmo tempo. Além disso, uma mesma carta pode ser vista como uma chave que abre várias portas de ideias simultaneamente, então, não deixe sua mente racional exigir definição demais, quando todas as coisas estão aí à sua disposição para serem usadas.

mundane
late 15c., from M.Fr. mondain (12c.), from L. mundanus “belonging to the world” (as distinct from the Church), from mundus “universe, world,” lit. “clean, elegant”; used as a transl. of Gk. khosmos (see cosmos) in its Pythagorean sense of “the physical universe” (the original sense of the Gk. word was “orderly arrangement”). L. mundus also was used of a woman’s “ornaments, dress,” and is related to the adj. mundus “clean, elegant” (used of women’s dress, etc.). Related: Mundanity.

novembro 7, 2010

A INCRÍVEL LISTA NEGRA DAS CARTAS MENOS QUERIDAS DO LEO

PODCAST aqui

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Todo mundo que estuda Tarot tem aquelas cartas que detesta, certo? Pois, eu não fujo à regra. Todo mundo já teve, ao menos uma vez na vida, uma ideia super legal em um desses momentos íntimos no banheiro, certo (banho, escovando os dentes, fazendo xixi… vocês sabem)? Pois é, também não fujo a essa regra, rs. Junte as duas coisas e temos o momento em que eu tive a mirabolante ideia de expor, aqui no blog, as cartas de que eu não gosto.

Uma regra geral sobre cartas malquistas (essa palavra existe?) é que, bastante como o resto de coisas na vida, elas nos são malquistas quase sempre porque não conseguimos entendê-las bem o suficiente, o que as torna responsáveis por aqueles antológicos momentos de embaraço, titubeio e gaguejo nas leituras. E então temos o lado B da minha ideia mirabolante – já que eu vou falar quais cartas são, por que não também estudá-las mais, para assim entendê-las melhor? É o que vamos fazer aqui!

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Primeiro, farei uma lista, na ordem, das cartas que mais me incomodam com breves comentários. Procurarei me ater às cartas mais confusas pra mim – caso contrário, metade do baralho estaria aqui. Vale dizer que, por cartas que eu não entendo, leiam-se aquelas com as quais eu não tenho uma ligação íntima que vá além dos conceitos-chave bobos. Elas são minhas ‘conhecidas’, em comparação com outras cartas ‘amigas’, e ainda outras ‘amantes’. E pra quem quiser saber, eu tenho um relacionamento estável de longa data com os Enamorados – é basicamente um ménage-à-trois.

Então, mãos à obra!

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A INCRÍVEL LISTA NEGRA DAS CARTAS MENOS QUERIDAS DO LEO


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Arcanos Maiores


A Grande Sacerdotisa – Tudo bem, ela é uma sacerdotisa, e ela é Grande. Tudo bem ainda, ela é a própria Lua, e o princípio feminino em si. Mas eu tenho que confessar, eu não gosto muito dela – talvez porque eu não gosto de mulher? (haha). A verdade é que a Grande Sacerdotisa quase sempre cala minha boca quando aparece numa leitura. Pra mim, na maioria das vezes, ela não diz muito além de segredos, mistérios, coisas ocultas, e a tal da ‘voz interior’ que, se eu mencionar em mais alguma consulta, eu apanho. Além desses clichés jaz um mar plácido de silêncio bem parecido, aliás, com o que existe às costas da nossa honrada dama. Assim, a Grande Sacerdotisa inaugura minha lista negra. Começamos bem.

O Imperador – essa é uma carta tão… tão… tão… que não me diz quase nada. Poder. Autoridade. Ordem. Regra. Rigidez. Tabom, mas e aí? Cartas grandiloquentes demais sempre me incomodam…

O Eremita esse é outro. Solidão. Exílio. Bla bla bla… Essa é uma das cartas mais estranhas pra mim.

 

A Roda da Fortuna – logo em seguida, temos a grande roda. Essa tem os símbolos mais confusos, enigmáticos e estranhos, e sempre me dá uma certa cinuca de bico na leitura, não tanto porque eu não a entendo, mas muito porque essa coisa de mudança é muito, muito (e eu vou por mais um) muito batida. “Eu vejo uma mudança na sua vida…” Uhun… O que mais podemos fazer de você, rodinha?

Temperança – eu, e toda a torcida do Corinthians (eu não acredito que eu acabei de mencionar um time de futebol no meu blog…) não gostam dessa carta. Gente, que carta mais confusa. E a sua correspondência com Sagitário então? Nonsense aparente – e, por favor, me poupem do papo batido de isso-de-correspondência-não-funciona. Claro que funciona. A Temperança é uma carta linda, mas tente lê-la em diversas situações, e sua cabeça dá um nó. Dentríssima da lista.

Julgamento – sem comentários sobre essa aqui. Simplesmente sem comentários. Nem sei o que dizer, dado meu nível de profunda compreensão dessa carta. Tem lugar de honra na lista negra.

O Mundo – êxito. Sucesso. Felicidade. Alegria. Plenitude. A tal da porra da Compleição. E não nos esqueçamos da Realização também. Além disso, o que temos? Vento. “Eu vejo um momento de intensa realização na sua vida” – e lá se vão 50 reais da mão do consulente pra mão do leitor. Sim…

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Naipe de Bastões


Oito de Bastõeseu tenho certeza que uma pessoa que olha o Rider-Waite-Smith pela primeira vez, ao passar os olhos sobre essa carta, vai pensar algo como “que porra é essa?”. É o que eu ainda sinto – embora não diga com tanta freqüência, especialmente durante leituras – por essa carta. Tabom, dardos, lanças me fazem sempre lembrar daquele esporte olímpico que nunca passa na TV aqui (porque quem mesmo se importa com outros esportes quando temos nosso incrível e mirabolante e maravilhoso futebol pra se preocupar, né? Falei de futebol denovo), chamado lançamento de dardos, ou algo assim. Coisas rápidas. Súbitas. OK… e daí? Uma vez essa carta caiu quando eu perguntei se ia ficar com um cara – e eu fiquei com ele no dia seguinte 😛

 

Mas ela vai pra listinha mesmo assim, vai ser divertido pesquisar sobre essa aqui.

Nove de Bastões – essa eu entendo, mas não entendo, então ela entra.

 

Rei de Bastões – o Rei de Bastões é esquisito. O Rei de Paus do Marseille era o personagem mais bonito (ou melhor, o menos feio) do baralho, então eu sempre dizia que ele era meu marido – porque eu sou megalomaníaco. Todas as figuras da corte são esquisitas – mas esse recebeu uma dose extra de estranhice. Lugar cativo na lista de Leondler (Leo + Schindler, gostou?)

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Naipe de Copas

 


Oito de Copasiniciamos o naipe de Copas com a incrível carta Oito de Copas. Saturno em Peixes. Certo. Só esse eclipse já é digno de colocá-la aqui. Eu entendo ela, mas não entendo também, e o eclipse me deixou sem outras alternativas, rsrs.

 

Rei de Copas eu acho que eu tenho um problema com reis…

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Naipe de Espadas


Ás de Espadasases são cartas esquisitas. Mas eu até dou conta dos dois ases anteriores. Agora, esse aqui… não dá. Já teve vezes que eu lindamente fingi que ele não estava na leitura. Mas não faz mal, eu sei que as consciências do Tarot sabiam que eu ia ignorar a carta, então… (desculpa esfarrapada).

Três de Espadassem comentários. Essa aqui, se eu pudesse, acidentalmente queimava.

 

Cinco de Espadasessa aqui quase não entra, porque trouxe uma mega confusão pra minha vida a última vez que tentei estudá-la. Mas vamos colocar ela aqui com muito cuidado e respeito, bem devagarinho, só pra constar, tá? Não fica brava comigo não, ok?

Seis de Espadasjá tentei umas três vezes entender essa carta mais a fundo. Como vocês podem perceber, não deu muito certo…

Sete de EspadasWTF? Essa é outra que traz momentos que-porra-é-essa.

Rei de Espadaseu e meu problema com reis. Sempre gostei mais dos Cavaleiros – porque eu tenho alma de princesa 😛

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Naipe de Pentáculos

 


Ás de Pentáculoso que? Não entendi… Fala denovo. Ahn?? Ah, sim, força material. Dinheiro. Assuntos materiais. “Cuz we are living in a material world, and I am a material girl…”

Sete de PentáculosOlhando, olhando… olhando mais um pouquinho. Mmhmm….Deixa eu olhar mais um pouquinho. Pamela, querida, dá pra fazer essa aqui denovo?

Rei de Pentáculossó pra não perder o costume. Ele ia ficar bravo se eu deixasse ele de fora…

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Pois, é isso. Futuramente, no blog, estarei tratando (vamos incluir o gerundismo na língua portuguesa – ‘não pode vencê-los, junte-se a eles’) dessas cartas aí. Talvez eu inclua tais posts na categoria Updates de Significado, talvez não – eu poderia mesmo criar uma categoria específica pra cartas que eu detesto, não?? Como é um número considerável de cartas – vinte e uma – talvez eu fale de mais de uma ao mesmo tempo em posts, especialmente aquelas pertencentes a um mesmo naipe.

outubro 28, 2010

UPDATES DE SIGNIFICADO 4 – do Saltimbanco ao Alto Mago – 400 anos em 4 minutos – ou uma só olhada!

Artesão. Pelotiqueiro. Saltimbanco. Ilusionista. Mágico. Mago. . . Um pouco de história – originalmente, parece que a figura do Mago do Tarot retratava um ilusionista de rua, que ganhava a vida fazendo truquezinhos baratos, atraindo a atenção de curiosos. Não sabe bem do que se trata? Dá uma passeadinha ali pela Praça da Sé, ou a XV de Novembro, e você vai ver essa ‘tradição’ ainda em vigor em pleno século 21.

O entertainer de rua era uma figura conhecida nas cidades do norte da Itália dos séculos 14 e 15. O mesmo indivíduo podia fazer malabarismo com bolas, vender remédios, arrancar dentes, contar histórias, cantar, dançar e ainda fazer alguns truquezinhos de mágica (Burke 1978). (…). A mesma coleção de entertainers de rua ainda podia ser encontrada em cidades europeias no final do século 19 e [no começo do] século 20 (Berouet and Laurendon 1995).

Embora os entertainers fossem simplesmente malandros, suas façanhas costumavam ser tão impressionantes que eles eram vistos como mágicos ilusionistas (Burke 1978, p. 94). Assim, não é de muita surpresa descobrir que a imagem do bagatto do século 15 acabou se tornando conhecida como o mago/mágico.

(Parte do artigo de Robert O’Neill sobre o Mago, para Tarot.com. Tradução minha)

Existe um certo impasse de tradução aqui. O mundo do Tarot contemporâneo é anglo-falante, e isso ninguém pode negar. A exemplo de muitas outras áreas de conhecimento, existe mais literatura de Tarot sendo produzida em inglês do que em qualquer outra língua. Em inglês, a palavra comumente usada para identificar a carta 1 do Tarot é magician, que pode ser usada para designar tanto o mago que se ocupa com magia num sentido metafísico (ex. Crowley, Merlin), quanto o mágico que trabalha com truques e ilusões (ex. David Copperfield, Mister M, David Blaine). Magician = ‘mago’ e ‘mágico’.

Durante o que é comumente chamado de Renascimento do Tarot, o período da história marcado pelo retorno da atenção de muitos para esse maço de cartas, nos séculos 18 e 19, a figura do saltimbanco medieval passou a ser retratada mais como um mago/alquimista, o que perdura com certa regularidade até hoje. Essa parcial mudança de sentido na figura do saltimbanco medieval deve-se muito provavelmente ao então novo ambiente conceitual no qual o Tarot era inserido – o ocultismo e a Alta Magia.

Temos assim uma certa progressão aqui, um processo de evolução da figura do saltimbanco para a figura do mago/feiticeiro. De um lado, o malandro ilusionista do século 15; do outro, o alto mago do século 19. Ainda que seja possível evocar algum nível de diferença entre essas duas figuras viventes no nosso imaginário, eu não acredito em uma distinção muito fundamental entre os, digamos assim, arquétipos do saltimbanco e do Mago.

Primeiro, o caráter da figura do Bagatto, renascentista abre espaço para mais de uma interpretação, especialmente quando se percebe que estamos aqui falando não de um só baralho, mas de uma série de figuras oriundas de baralhos diferentes, dos quais, de acordo com O’Neill, cinco sobreviem até hoje. Dando uma olhada na iconografia renascentista como um todo, verificamos que a figura de um homem diante de uma mesa coberta de utensílios e ferramentas era frequentemente usada para retratar o alquimista e sua Obra, ou o artesão e seu trabalho – e não só o bagatto. Não obstante, basear-se nesse fato para legitimizar uma suposta origem concreta da figura do Mago como feiticeiro é ir longe demais – e também é desnecessário, visto que a figura do Mago ter sido assim desde o começo não legitimiza nada.

O que o Mago e o saltimbanco têm em comum? Ambos manipulam a realidade de acordo com sua vontade. De fato, seja por meio da manipulação das energias, seja por meio do ilusionismo, tanto o mago quanto o mágico trabalham e mexem com a realidade. Tudo está nos olhos de quem vê – realidade é percepção. O mágico nos faz acreditar que as coisas são de uma certa maneira e, no âmbito da mágica ao menos, as coisas são o que acreditamos que elas sejam. É como uma encenação, como um teatro – é uma realidade ‘de mentirinha’ que, no entanto, é real. Quando vemos as coisas por esse ângulo, percebemos que o suposto gap entre o ilusionista renascentista e o mago vitoriano não é tão grande assim, pois o trabalho de ambas as figuras consiste em, por meio da vontade, moldar a realidade. Pense no regente que, com sua batuta, manipula cada instrumento da orquestra e cria a música.

Dessa forma, a figura do bagatto e do mago feiticeiro se fundem para darem origem a um personagem poderoso e dinâmico, que sabe exatamente quando e o que fazer. Magia é a manipulação das forças dinâmicas elementais que são como que os blocos formadores da realidade – não muito diferente, em conceito, da química, que trabalha com os elementos formadores da matéria. A propósito, vale lembrar que a química contemporânea é uma área do saber que deu seus primeiros passos na própria alquimia. Tanto a Magia quanto a química mexem com as coisas em seu nível radical – o lugar de onde as coisas se originam. O Mago mexe na linguagem HTML da realidade, entendeu? É nesse sentido que o Mago mexe com as tais forças ocultas, invisíveis aos nossos olhos, da mesma forma que o ilusionista age em segredo por trás dos panos ou por baixo da mesa. “Ocultas” porque desconhecidas da maioria. De fato, não é muito difícil pensar em magia quando vemos certas coisas que a tecnologia é capaz de realizar – mais uma vez, tudo tem a ver com a nossa percepção, e a nossa noção do que é aceitável como “normal” e do que não é. É sobre essas duas coisas que o ilusionista age, e são essas duas coisas que o Mago mexe com seu trabalho.

Por fim, temos na raiz da figura Mago também a imagem do artesão, aquele que trabalha a matéria e cria algo novo. O artesão trabalha por meio da ténica, e essa é outra palavra que tem tudo a ver com o Mago do Tarot.

técnica
téc.ni.ca
sf (fem de técnico) 1 Conhecimento prático; prática. 2 Conjunto dos métodos e pormenores práticos essenciais à execução perfeita de uma arte ou profissão.

Um artesão experiente trabalha também com destreza – e eu já comentei aqui como que um trabalho executado com habilidade pode ser comparado a mágica. A técnica e a habilidade são duas faculdades do Mago que garantem o seu fascínio, e sua graça. Também o ilusionista faz uso dessas duas qualidades em sua atividade. Assim como o Mago e o ilusionista, o artesão põe a mão na massa e cria. Ele literalmente molda a matéria de acordo com sua vontade, com sensibilidade, destreza e habilidade.

A lição mais interessante que compor esse texto me ensinou foi a de que as imagens do Tarot, cada uma delas, são em si uma constelação de imagens e ideias. Cada imagem, ainda que homogênea, exibe traços das figuras que a compuseram, e conhecer mais tais figuras enriquece nosso entendimento da imagem.

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SIGNIFICADOS CONCRETOS

  • Da figura do pelotiqueiro, o Mago herda sua destreza, seu dinamismo e sua versatilidade;
  • Foco, enfoque preciso e o poder de efetuar mudanças são algumas das qualidades que o Mago compartilha com a figura do feiticeiro, bem como com os cientistas, os feiticeiros modernos;
  • Ação, atividade, auto-confiança e determinação são qualidades comuns das quais tanto o ilusionista e o Mago são bons expositores;
  • O Mago é uma carta essencialmente masculina, no sentido de que ele pede ou indica ação afirmativa e decisiva sobre um assunto. A ação do Mago é extremamente bem calculada;
  • Esperteza, inteligência, vivacidade, eloqüência e poder de comunicação são algumas qualidades que o Mago compartilha com Mercúrio, o planeta ao qual essa carta corresponde no sistema da Golden Dawn;
  • Não duvide de sua própria capacidade de realização quando o Mago lhe aparecer – em vez disso, faça dela um bom uso;
  • O Mago representa qualquer tipo de especialização e expertise em um determinado campo de conhecimento, portanto, se você tem o talento, formalize-o aprendendo a técnica;
  • Não seja vítima das circunstâncias – crie-as.
  • A ação do Mago denota controle – e, para controlar o mundo, você precisa começar por si mesmo. É controlando os seus elementos internos que o alquimista controla os elementos externos em sua Obra. Assim, o Mago também pede auto-controle e disciplina.

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IMAGEM

A imagem do Mago para esse post é a versão dessa carta no Tarot of the New Vision. Criado por Pietro Alligo e Gianluca Cestaro e publicado pela Lo Scarabeo em 2003, o New Vision mostra cada imagem do Rider-Waite-Smith do ponto de vista de seus personagens, bem como o que está por trás de cada uma delas. Decidi usar essa imagem justamente porque ela combina tanto a figura do Alto Mago com a do saltimbanco, colocando-lhe na frente não as portas de algum tempo, mas uma plateia de camponeses e, em suas costas, um macaquinho – que deve ajudar nos truques.

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Você pode ler mais sobre o Mago aqui.

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